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Desvendando os segredos da dependência tecnológica

admin

Uma reflexão filosófica sobre o livro "Hooked" de Nir Eyal

Você já parou para pensar em como a tecnologia está mudando nossa relação com o mundo? E se eu te disser que a maneira como usamos a tecnologia está moldando nossos hábitos e nos tornando dependentes de produtos e serviços que mal sabemos que estamos usando? É sobre isso que o livro “Hooked” de Nir Eyal trata – uma reflexão profunda sobre como as empresas usam a psicologia comportamental para criar produtos que nos viciam e nos mantêm presos em seus ecossistemas. Mas o que isso significa para nós como seres humanos?

É verdade que o ciclo de criação de hábitos em usuários é uma técnica poderosa para criar produtos que atendam às necessidades dos usuários e melhorem suas vidas. Mas será que isso vem com um preço? À medida que nossos hábitos são cada vez mais moldados por algoritmos e interfaces de usuário projetadas para criar dependência, perdemos a capacidade de controlar nossas próprias vidas?

Talvez seja necessário refletir sobre o que significa ser humano em um mundo onde nossos hábitos são tão facilmente manipulados. Como indivíduos, somos capazes de escolher nossos próprios caminhos e definir nossas próprias metas, ou estamos simplesmente seguindo um roteiro escrito por engenheiros de tecnologia?

Outra questão intrigante é se o ciclo de criação de hábitos é ético ou não. Até que ponto as empresas têm o direito de usar técnicas psicológicas para criar dependência em seus usuários? O que acontece quando os usuários perdem a capacidade de controlar seus próprios hábitos e estão viciados em um produto ou serviço?

Essas são questões profundas que merecem uma reflexão cuidadosa. Como indivíduos, precisamos ser conscientes dos hábitos que estamos criando e das forças que estão moldando nossas escolhas. Como sociedade, precisamos nos perguntar se estamos dispostos a permitir que as empresas controlem nossas vidas e a mudem nossa relação com o mundo.

O livro “Hooked” de Nir Eyal nos faz questionar a natureza do progresso e do desenvolvimento humano. Onde estamos indo como sociedade, e a que custo? Como podemos garantir que nossas escolhas sejam baseadas em nossos próprios valores e desejos, e não em algoritmos projetados para manipular nossos hábitos?

Essas são perguntas que precisamos responder à medida que continuamos a avançar no mundo cada vez mais tecnológico. Se quisermos criar um futuro onde a tecnologia sirva a humanidade em vez de subjugá-la, precisamos estar dispostos a refletir sobre nossas próprias escolhas e a questionar os modelos que moldam nossas vidas.

Mas e os ciclos de criação de hábitos em usuários?

“Hooked”de Nir Eyeal não é essencialmente um livro cujo objetivo principal é questionar os ciclos de criação de hábito, mas apresentar e ensinar a sua própria teoria para criação de hábitos, o modelo ou ciclo Hooked, que podemos traduzir como Modelo ou Ciclo de Gancho.

 

O Ciclo de Gancho de Nir Eyeal

O “Ciclo do Gancho” é um modelo de quatro etapas que muitas empresas usam para criar hábitos em seus usuários. Essas etapas são gatilho, ação, recompensa e investimento. O objetivo do ciclo do gancho é criar um hábito em que a ação do usuário é iniciada por um gatilho e recompensada, tornando mais provável que o usuário volte a realizar a ação no futuro.

Este modelo se baseia na nossa necessidade como seres humanos de buscar recompensas e evitar a dor. De acordo com os estudos de Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, as pessoas são motivadas principalmente por duas forças: o prazer de ganhar e a dor de perder. Essas forças afetam nosso comportamento de maneiras previsíveis e podem ser usadas por empresas para criar hábitos em seus usuários.

O gatilho é a primeira etapa do ciclo do gancho. Ele é um estímulo que leva o usuário a tomar uma ação. Os gatilhos podem ser externos, como uma notificação no celular, ou internos, como uma sensação de tédio ou ansiedade. Os gatilhos externos são os mais comuns e são usados com frequência por empresas que querem manter os usuários engajados com seus produtos.

A ação é a segunda etapa do ciclo do gancho. Ela é a resposta do usuário ao gatilho. A ação pode ser algo simples, como rolar o feed do Instagram ou abrir um aplicativo, ou algo mais complexo, como fazer uma compra on-line. A ação precisa ser fácil e rápida para que o usuário possa realizá-la sem esforço.

A recompensa é a terceira etapa do ciclo do gancho. Ela é o que motiva o usuário a realizar a ação novamente no futuro. A recompensa pode ser qualquer coisa que faça o usuário se sentir bem, como uma nova mensagem no celular ou um desconto em uma compra. É importante que a recompensa seja imediata para que o usuário associe a ação ao prazer de receber a recompensa.

A última etapa do ciclo do gancho é o investimento. Ela ocorre quando o usuário gasta tempo, dinheiro ou esforço para melhorar o uso do produto ou serviço. Isso torna mais provável que o usuário continue usando o produto no futuro e se torne mais engajado com ele.

Em resumo, o Ciclo do Gancho é um modelo que muitas empresas usam para criar hábitos em seus usuários. Ele se baseia na nossa necessidade como seres humanos de buscar recompensas e evitar a dor, conforme estudado por Daniel Kahneman. Compreender como as empresas usam o Ciclo do Gancho pode ajudar os usuários a se tornarem mais conscientes de suas ações e tomar decisões mais informadas sobre o uso de produtos e serviços.

 

Existem outro autores que também estudam o ciclo de criação de hábitos em usuários?

Sim, existem outros autores que estudam este ciclo utilizando terminologias diferentes.

Por exemplo, o psicólogo B.J. Fogg criou o modelo Fogg Behavior Model (FBM), que é semelhante ao Ciclo do Gancho. O FBM também tem três elementos principais: gatilho, motivação e capacidade.

O gatilho no FBM é semelhante ao gatilho no Ciclo do Gancho, pois é um estímulo que leva o usuário a realizar uma ação. A motivação é a força motivadora por trás da ação e pode ser dividida em três categorias: sensação de prazer, evitação de dor e busca por esperança. A capacidade refere-se à facilidade com que o usuário pode realizar a ação.

Outro modelo semelhante é o modelo COM-B, desenvolvido por Susan Michie, Maartje van Stralen, e Robert West, que também tem três elementos: capacidade, oportunidade e motivação. A capacidade é semelhante à capacidade no FBM, pois refere-se à facilidade com que o usuário pode realizar a ação. A oportunidade refere-se aos fatores externos que podem influenciar a ação, como tempo e localização. A motivação é semelhante à motivação no FBM e é a força motivadora por trás da ação.

Embora esses modelos possam ter diferenças em suas terminologias e estruturas, todos compartilham a ideia de que a criação de hábitos em usuários envolve uma série de etapas que incluem gatilho, ação e recompensa. Esses modelos podem ser úteis para entender como as empresas criam produtos que mantêm os usuários engajados e viciados em seus produtos, bem como para ajudar os usuários a tomar decisões informadas sobre o uso desses produtos.

 

O ciclo de criação de hábitos em usuários não é inerentemente bom ou ruim

Tudo depende de como as empresas utilizam essa técnica. No entanto, existem empresas que utilizam esses ciclos de maneira negativa, manipulando os usuários e criando vícios em seus produtos e serviços. Aqui estão cinco exemplos:

  1. Facebook – A plataforma usa gatilhos como notificações de curtidas e comentários para manter os usuários engajados e viciados em seus feeds de notícias. Além disso, o algoritmo do Facebook é projetado para exibir conteúdo que aumenta o engajamento dos usuários, o que pode levar a uma bolha de filtro e desinformação.
  2. Instagram – A plataforma usa o mesmo modelo do Facebook, com notificações e algoritmos projetados para manter os usuários engajados. Além disso, o Instagram incentiva o compartilhamento de fotos e vídeos que exibem um estilo de vida idealizado, levando a comparações negativas e baixa autoestima em alguns usuários.
  3. YouTube – A plataforma usa recomendações de vídeo para manter os usuários assistindo por mais tempo. O algoritmo do YouTube é projetado para exibir vídeos que o usuário provavelmente gostará e incentiva o binge-watching, o que pode levar a uma perda de tempo e baixo nível de produtividade.
  4. Candy Crush – O jogo usa o modelo do ciclo de criação de hábitos para manter os usuários jogando por mais tempo. O jogo usa gatilhos, como a promessa de recompensas e desafios diários, para manter os usuários engajados e incentivá-los a jogar mais.
  5. Robinhood – O aplicativo de negociação de ações usa o modelo do ciclo de criação de hábitos para incentivar os usuários a negociar ações com mais frequência. A plataforma usa notificações e alertas para informar os usuários sobre movimentos no mercado e incentivar a tomada de decisões rápidas, o que pode levar a decisões financeiras arriscadas e prejudiciais.

Existem muitas empresas que usam o ciclo de criação de hábitos em usuários de maneira positiva, ajudando as pessoas a melhorar suas vidas. Aqui estão cinco exemplos:

  1. Headspace – O aplicativo de meditação usa o ciclo de criação de hábitos para incentivar as pessoas a meditar regularmente. O aplicativo usa gatilhos, como notificações diárias, para lembrar os usuários de meditar. Além disso, o aplicativo oferece recursos como meditações guiadas e exercícios de respiração para ajudar os usuários a desenvolver um hábito saudável de meditação.
  2. Fitbit – O dispositivo de monitoramento de atividades usa o ciclo de criação de hábitos para incentivar as pessoas a se exercitar regularmente. O dispositivo usa gatilhos, como notificações e alertas, para lembrar os usuários de atingir suas metas diárias de exercício. Além disso, o aplicativo Fitbit fornece informações úteis sobre a atividade física do usuário para ajudar a manter o hábito de exercício saudável.
  3. Duolingo – O aplicativo de aprendizagem de idiomas usa o ciclo de criação de hábitos para incentivar as pessoas a aprender um novo idioma. O aplicativo usa gatilhos, como notificações e desafios diários, para lembrar os usuários de praticar diariamente. Além disso, o aplicativo oferece recursos como exercícios de vocabulário e gramática para ajudar os usuários a desenvolver habilidades linguísticas.
  4. Habitica – O aplicativo de gerenciamento de tarefas usa o ciclo de criação de hábitos para incentivar as pessoas a completar tarefas diárias. O aplicativo usa gatilhos, como notificações e recompensas, para incentivar os usuários a completar suas tarefas diárias. Além disso, o aplicativo transforma a gestão de tarefas em um jogo, incentivando os usuários a desenvolver hábitos saudáveis ​​de produtividade.
  5. Peloton – A plataforma de fitness online usa o ciclo de criação de hábitos para incentivar as pessoas a se exercitar regularmente. A plataforma usa gatilhos, como notificações de aulas ao vivo e desafios, para incentivar os usuários a se exercitar regularmente. Além disso, a plataforma oferece aulas de fitness guiadas por instrutores de renome para ajudar os usuários a desenvolver hábitos saudáveis ​​de exercício.

 

A questão dos ciclos de criação de hábitos em usuários é complexa e multifacetada, e não há respostas fáceis.

É importante lembrar que a tecnologia está mudando nossa relação com o mundo, e precisamos estar conscientes dos hábitos que estamos criando e das forças que estão moldando nossas escolhas. Devemos ser capazes de controlar nossas próprias vidas e definir nossas próprias metas, em vez de seguir um roteiro escrito por engenheiros de tecnologia.

Nós, como indivíduos e como sociedade, precisamos nos questionar sobre o impacto da tecnologia em nossas vidas e em nossa capacidade de sermos seres humanos autônomos. Devemos nos perguntar se estamos dispostos a permitir que as empresas controlem nossas vidas e a mudem nossa relação com o mundo.

O livro “Hooked” de Nir Eyal é um convite para a reflexão filosófica sobre a natureza do progresso e do desenvolvimento humano. Se quisermos criar um futuro onde a tecnologia sirva a humanidade em vez de subjugá-la, precisamos estar dispostos a refletir sobre nossas próprias escolhas e a questionar os modelos que moldam nossas vidas. Afinal, só assim poderemos aproveitar as possibilidades que a tecnologia oferece e garantir um futuro mais justo e humano para todos.

 

Curtiu o assunto? Qual é a sua percepção sobre os ciclos de criação de hábitos? Compartilhe suas ideias e opiniões nos comentários abaixo!

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